sábado, 9 de agosto de 2008


        MANUEL BANDEIRA

          POÉTICA

          Estou farto do lirismo comedido
          Do lirismo bem comportado
          Do lirismo funcionário público com livro de ponto
          expediente protocolo e manifesta-
          ções de apreço ao Sr. diretor.
          Estou farto do lirismo que pára e vai averiguar no
          dicionário o cunho vernáculo de
          um vocábulo
          Abaixo os puristas

          Todas as palavras sobetudo os barbarismos univer-
          sais
          Todas as construções sobretudo as sintaxes de ex-
          ceção
          Todos os ritmos sobretudo os inumeráveis

          Estou farto do lirismo namorador
          Político
          Raquítico
          Sifilítico
          De todo lirismo que capitula ao que quer que seja
          fora de si mesmo
          De resto não é lirismo
          Será contabilidade tabela de co-senos secretário do
          amante exemplar com cem mo-
          delos de cartas e as diferentes ma-
          neiras de agradar às mulheres, etc.
          Quem antes o lirismo dos loucos
          O lirismo dos bêbados
          O lirismo difícil e pungente dos bêbados
          O lirismo dos clows de Shekespeare

          -- Não quero mais saber do lirismo que não é libertação.


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