sábado, 9 de agosto de 2008


CASTRO ALVES

        O GONDOLEIRO DO AMOR

        Teus olhos são negros, negros,
        Como as noites sem luar...
        São ardentes, são profundos,
        Como o negrume do mar;

        Sobre o barco dos amores,
        Da vida boiando à flor,
        Douram teus olhos a fronte
        do Gondoleiro do amor.

        Tua voz é a cavatina
        Dos palácios de Sorrento,
        Quando a praia beija a vaga,
        Quando a vaga beija o vento;

        E como em noites de Itália,
        Ama um canto o pescador,
        Bebe a harmonia em teus cantos
        O Gondoleiro do amor.

        Teu sorriso é uma aurora,
        Que o horizonte enrubesceu,
        -Rosa aberta com o biquinho
        Das aves rubras do céu.

        Nas tempestades da vida
        Das rajadas no furor,
        Foi-se a noite, tem auroras
        O Gondoleiro do amor.

        Teu seio é vaga dourada
        Ao tíbio clarão da lua,
        Que, ao murmúrio das volúpias,
        Arqueja, palpita nua;

        Como é doce, em pensamento,
        Do teu colo no languor
        Vogar, naufragar, perder-se
        O Gondoleiro do amor!?...

        Teu amor na treva é - um astro,
        No silêncio uma canção,
        É brisa - nas calmarias,
        É abrigo - no tufão;

        Por isso eu te amo querida,
        Quer no prazer, quer na dor...
        Rosa! Canto! Sombra! Estrela!
        Do Gondoleiro do amor.

        Recife, janeiro de 1867.
        in Espumas Flutuantes - 1870.

        * Referências Italianas e os Olhos Negros da Amante Portuguesa
        O poema é uma barcarola dedicada a Eugênia Câmara, atriz portuguesa
        e o grande amor de Castro Alves. Observe a associação da cor dos olhos
        da "dama negra" com a idéia de profundidade.




Nenhum comentário: